domingo, 1 de agosto de 2010

Nowhere Love. Parte 2

Saí da casa de Felipe com os sentimentos transbordando pelos olhos. Eu tinha certeza que aquela noite seria longa. Corri pela rua, vendo tudo que não devia ver. As vielas da cidade cheiravam à morte fresca, sexo fresco, ácido fresco, álcool fresco. Desde 1989, quando eu tinha cerca de 10 anos, a cidade já era assim, perdida. Eu sempre me perguntei quantas pessoas morriam, à noite, no centro da cidade do Rio de Janeiro. E não havia pesquisas que me explicassem isso.
Por fim, esbarrei em um cartaz que dizia: “Die lüge – A mentira”. Era o anúncio de uma peça. Provavelmente era mais uma daquelas peças idiotas, sem conteúdo e com atores tão péssimos quanto os que atuam em ‘Malhação’. Mas quem sou eu para criticar? Senti-me atraída pela peça apenas pelo nome em Alemão. Decidi que assistiria. Me arrependi.
- Uma inteira, por favor. – A moça que vendia os bilhetes tinha o rosto simpático, mas as rugas revelavam um sofrimento no passado. Resolvi ficar quieta.
- Inteira, tem certeza? Você me parece jovem, menina. – Eu sabia que ela era simpática. Estava fazendo isso tudo só para eu pagar menos. Mas eu não estava com cabeça pra isso.
- Tudo bem, moça. Quero uma inteira mesmo. – Tentei sorrir. Falhei.
- Então tudo bem, menina. Eu só tenho ingressos para a primeira fileira. Algum problema?
- Nenhum.

A fachada do teatro era-me familiar. Acho que era ali que meu avô me levava quando eu era mais nova, mas naquela época as coisas eram diferentes. Drogados não se faziam presentes, espalhados pela rua, a pintura ainda tinha cores vívidas e não aquele cinza sujo pelo tempo, não havia marcas de sangue no chão, nem agulhas pela calça.
Entrei.
Coragem.
A segunda virtude, pra mim, é a coragem. Às vezes tudo que precisamos é um pouco de coragem, não importa se esse encorajamento sai de nosso interior ou se ela vem como a ajuda que precisamos, de um anjo da guarda. A vida é um jogo de azar e o vencedor é sempre aquele que tem a maior cara de pau.
Vale ressaltar que naquela noite eu descobri que autoconfiança em demasia pode prejudicar.

3 comentários:

  1. Estou gostando.. Você tem uma narrativa bem parecida com a Sidney Sheldon, se não fosse pela primeira pessoa, seria igual.. Muito bom mesmo.

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  2. Belo final, não deixou a desejar; e está me matando de curiosidade. E ressalva para seu narrador personagem que revela a cada linha seu seu modo de ser e viver, de um modo tão... forte.

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  3. Adoro como você escreve, você tem um dom e eu tenho inveja dele. :)

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