domingo, 31 de outubro de 2010

Nowhere Love. Parte 4

De certo eu devia ter corrido quando vi o Harry Haller vindo na minha direção. Continuei por vontade.

Vontade.

A gente costuma perder as estribeiras por vontade. Continuei sim e só não admito porque não sei do que aquela vontade se tratava. Era diferente de desejo, tinha uma temporalidade diferente. Eu sempre quis ser atemporal. E eu sei que muita gente morre de (por) vontade. E naquela noite eu precisava encontrar alguma forma de morrer.

- Tá sozinha? – Ele era mais bonito de perto. Elegante, um coroa pegável. Um George Clooney da vida, sabe?

- To esperando uma pessoa. – É claro que eu não esperava ninguém, mas eu não deveria ser tão oferecida. Fui criada em família católica e por conta disso eu carrego comigo uns valores tão estúpidos quanto a minha imagem-e-semelhança.

- Você não se importa de eu esperar contigo, não é? Eu estou esperando o meu filho... Aliás, ali vem ele...

O garoto que entrou pela porta do teatro era talvez o meu sonho de consumo ou algo do tipo. Tinha a minha idade e, mesmo em 1995, ele ainda tinha esperanças de um renascimento do Grunge. Ele era, talvez, o meu Kurt Cobain perdido. Não pude deixar de evitar aquilo. Pai e filho, juntos, tão lindos.

- Desculpa, pai, sabe cumé né, a mãe tava enchendo a merda do saco pra eu catar as guimbas lá no meu quarto. – Ele era estranho, de modo que todas as suas informalidades pareciam-lhe formais. – Quem é a tua amiga?

Corei.

- Aaah, essa é a... Bom, qual é o seu nome? O meu é Álvaro e o do meu filho é Felipe – Felipe? Estava bom demais pra ser verdade, não? Por que diabos um nome tão ruim?

- Ana Luíza – Menti. Algo me impediu de dizer meu nome, deve ter sido o desnorteamento.

- Bem AnaLu... Posso te chamar assim? – O novo Felipe tinha um sorriso exageradamente amarelado. Provavelmente cigarros. – Eu e meu pai sempre vamos a um pub que tem aqui por perto após as peças. Não quer ir conosco não?

Aceitei o convite, pensando em fidelidade.

Fidelidade.

Muita coisa acontecera em pouco tempo, mas o meu namoro com o Felipe ainda existia e eu não fui fiel. Fidelidade é importante em relacionamentos, não? Não fui fiel a ele. Às vezes me pergunto se fui fiel a mim mesma.

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